Há algumas versões sobre a origem da caipirinha, patrimônio nacional dos coquetéis.
A mais confiável é a do historiador, sociólogo e folclorista potiguar Câmara Cascudo que a bebida foi criada pelos fazendeiros de café do interior de São Paulo como um drinque para festas de alto padrão.
Apesar da origem nas classes mais abastadas, a receita se popularizou por outras regiões do estado por causa do baixo custo e da facilidade de encontrar os ingredientes.
No fim do século XIX era a bebida paulista símbolo, antes mesmo de começar a consumida em outras regiões do país – e talvez daqui dê para puxar o fio da meada do nome pelo qual ficou conhecida.
Só que a versão mais divertida, de longe, é a imaginada pelo escritor e humorista Jô Soares em seu livro O Xangô de Baker Street.
Segundo ele, a caipirinha nasceu na tentativa de curar uma ressaca num botequim na esquina das ruas do Resende e Riachuelo, em pleno Rio de Janeiro.
Seus protagonistas foram, vejam só, Sherlock Holmes e o detetive Watson, que estavam no Brasil para uma investigação a pedido do imperados Dom Pedro II.
Diz a história.
Os quatro se dirigiram a um botequim na esquina da Rua Riachuelo. Saraiva, com invejável experiência etílica, encomendou duas doses da melhor aguardente da casa e entornou seu copo num gole preciso. Quando o doutor Watson viu o líquido transparente, que exalava um fortíssimo cheiro de álcool, indagou o que vinha ser aquela bebida.
— Nada de mais, Watson, apenas uma aguardente feita de cana-de-açúcar. O professor Saraiva assegura que possui excelentes propriedades curativas – traduziu Sherlock para o amigo.
— Não sei, Holmes, pelo cheiro, parece-me algo fortíssimo. Talvez seja conveniente não bebê-la pura – aconselhou.
— Que faço, então? Ponho um pouco de água?
— Acho que o sumo de fruto seria melhor. Laranja ou limão. São ótimos remédios. Já conhecemos suas ótimas propriedades contra o escorbuto.
Sherlock virou-se para o dono do botequim.
— Meu amigo aqui está sugerindo que eu coloque um pouco de sumo de laranja ou limão na bebida. Por acaso o senhor tem alguma dessas frutas?
— Tenho limões – respondeu, intrigado, o proprietário, sem tirar os olhos do chapéu e das sandálias nordestina que o doutor ainda calçava.
Watson completou:
— Talvez seja bom acrescentar um pouco de gelo e açúcar, Holmes, para compensar a queima produzida pelo álcool.
Sherlock Holmes transmitiu as exigências do doutor. O botiquineiro dirigiu-se ao fim do balcão e ordenou que seu empregado trouxesse o pedido. Watson cortou o limão em quatro e depositou dois pedaços no copo junto ao açúcar. Depois, pôs-se a amassar as fatias com uma colher, enquanto dizia:
— Por via das dúvidas, é melhor colocar o gomo inteiro e espremer.
Quando terminou aquela operação, acrescentou uns pedaços de gelo e entregou a curiosa poção ao detetive:
— Pronto, Holmes, acho que agora você pode beber sem correr perigo.
No fundo do bar, o empregado e o dono do botequim olhavam, fascinados. O jovem balconista perguntou:
— Patrão, que língua eles estão falando?
— Sei lá. Para mim ou é latim ou é coisa do demo.
— E que mixórdia é aquela que eles estão fazendo?
— Uma invenção daquele caipira ali – disse, apontando o chapéu de vaqueiro de Watson.
— Qual deles, o grandão? – perguntou o rapaz, indicando Shelock Holmes, todo de branco.
— Não, o caipira grande está só bebendo. Quem preparou foi o menorzinho, o caipirinha, batizando assim, para sempre, a exótica mistura.
A cena ganhou até o registro cinematográfico no filme homônimo dirigido em 2001 pelo diretor Miguel Faria Jr. Assista:]